White balance
Eduardo Baptista
coluna Fique Ligado, revista Zoom Magazine
Se aquela propaganda do sabão em pó estiver certa, existirá sempre um branco mais branco do que os outros. Mas... afinal, o que é branco, ou, melhor, o que significa a cor branca? Sabemos que todas as cores podem ser formadas a partir da combinação de algumas poucas delas, chamadas cores básicas, o conhecido trio de cores RGB - Red, Green, Blue. Se combinarmos luzes nas cores vermelha, verde e azul na mesma proporção de intensidade obteremos luz branca. Se, a seguir, com esta luz obtida, iluminarmos uma superfíce branca qualquer, ela igualmente nos parecerá branca. Na verdade, por trás desta equação simples está a resposta para entendermos como funcionam as cores que o nosso olho percebe.
A cor que uma determinada superfície possui depende da luz que ilumina essa superfície e depende também de como ela reage a essa luz. Entendendo melhor: a tinta da caneta esferográfica azul é azul quando iluminada por uma luz branca (a que possui mesmas quantidades de vermelho / verde / azul) porque absorve toda luz vermelha e verde e reflete toda a luz azul. Ou seja, a cor depende de como a superfície reage à luz que a ilumina (que cores absorve e que cores reflete). A batata frita é amarela porque reflete o vermelho e o verde e absorve o azul: vermelho + verde = amarelo. Variando-se e combinando-se diferentes proporções absorvidas/refletidas das cores RGB obtém-se todas as demais cores, como por exemplo o marrom do chocolate.
Agora vamos pensar naquela camisa do sabão em pó: por quê ela é branca? Ela é branca porque reflete em iguais proporções cada um dos componentes RGB e a soma destas três cores é a cor branca. Muito bem, vamos agora fazer uma coisa: tirar uma foto com uma câmera comum dessa camisa debaixo da luz fluorescente que ilumina a área de serviço e depois outra debaixo da luz incandescente do quarto. Ao revelar, surge o resultado: a camisa está ligeiramente esverdeada em uma foto e amarelada na outra. Propaganda enganosa do sabão em pó? Não. Na verdade isso acontece, como foi dito acima, porque a cor de uma determinada superfície depende, além de como ela reage à luz que à ilumina, também da própria luz que a ilumina.
As luzes em nosso mundo possuem diferentes tonalidades (temperaturas) de cor: a luz incandescente tende para o vermelho, a fluorescente comum para o verde. A luz do Sol seria a mais equilibrada em termos de frequências do espectro de cores. Seria, porque isso acontece lá fora no espaço, até que ela chegue ao nosso planeta. Elementos da atmosfera tornam-a ligeiramente avermelhada no início e no fim do dia. Um dia com céu nublado torna-a ligeiramente azulada e mesmo em dias claros um tom ligeiramente azulado também acontece, decorrente da cor azul do céu. Assim, no mundo real, é muito difícil obter-se uma luz perfeitamente branca. E como a camisa "branca" reflete toda a luz que incide sobre ela, está explicado porque existem brancos e mais brancos. Só que no nosso mundo da videprodução não é aceitável o ator sair da cozinha da casa com a camisa de uma cor e chegar na sala com a camisa de outra cor. Mas porque isso não nos incomoda, ou pelo menos não nos chama a atenção em nossas próprias casas e ao mesmo tempo aparece naquelas fotos mencionadas acima?
Isso acontece porque o nosso cérebro percebe essas variações de tonalidade nas cores e na maioria das vezes efetua correções: certamente nunca ocorreu a você perguntar a alguém de sua casa se trocou de roupa quando veio da cozinha para a sala. Em outras situações em que não está acostumado nosso cérebro não se preocupa com isso: é quando você "descobre" que seu carro estacionado à noite debaixo do poste de luz de mercúrio na rua "mudou de cor". Porém a máquina fotográfica, a câmera de vídeo e a câmera de cinema não possuem cérebro como nós (pelo menos por enquanto...), então elas vêem e registram as coisas como realmente elas são. Para corrigir estes problemas, fotógrafos e cineastas lançam mão de filtros colocados sobre a objetiva: um filtro azul por exemplo corrige o excesso de vermelho. Ou então de películas fotográficas previamente balanceadas para determinada finalidade: um filme do tipo "indoor" por exemplo é menos sensível ao vermelho.
No mundo do vídeo podem ser utilizados também filtros e quanto às fitas, claro, ao contrário dos filmes não existe fita de vídeo mais sensível a uma determinada cor do que a outra. Porém o recurso mais utilizado aqui é o balanço do branco, ou, white balance. Se o problema todo se resume a um desequilíbrio nas proporções das cores básicas, bastaria ajustá-las para mais ou para menos até este equilíbrio ser atingido. Na realidade é isso mesmo o que o circuito eletrônico da câmera faz, como se existissem ali "botões de volume", iguais aos de som, só que para cores, um para cada cor básica: aumentando ou diminuindo esses "botões", até que as intensidades fiquem iguais, ou seja, vermelho=verde=azul.
O processo, conhecido como "bater o branco", consiste em apontar a câmera para uma superfície branca qualquer, no local onde a gravação será feita, enquadrando-a completamente no visor. A seguir pressiona-se durante alguns segundos um botão existente nas câmeras profissionais e na maioria das semi-profissionais: o botão white balance, até que apareça no visor a indicação de que o ajuste terminou. Durante esse tempo, o circuito eletrônico da câmera analisa o que ela está "vendo", decompondo o sinal lido em R+G+B, supondo que deveria ser um branco correto, ou seja, que R=G=B. Se no entanto o vermelho por exemplo for mais intenso do que as outras duas cores, ele diminui sua intensidade, até que R=G=B. A seguir o circuito "trava" a câmera nessa regulagem, até que uma outra seja feita. E você já percebeu então que para onde a câmera for apontada a partir de agora ela estará sempre corrigindo o excesso de vermelho.
Se a câmera for levada para outro local ou se a iluminação no ambiente mudar, o processo deve ser refeito. E a tal superfície branca pode ser qualquer uma, desde que esteja sujeita (isso é importante) às mesmas condições de luz do local de gravação. Um cartão ou papel branco, uma camiseta branca e até mesmo uma folha de jornal em situações de emergência podem ser utilizados (o papel jornal não é muito branco mas ajuda - as letras, se pretas, não alteram o ajuste). Equipamentos profissionais e semi podem ser desligados e religados: o ajuste não se perde, uma vez que fica armazenado em um chip alimentado por uma pequena bateria.
Menos preciso do que o ajuste manual descrito acima, o modo auto white balance tenta o tempo todo fazer essa correção. O circuito eletrônico mede separadamente as intensidades dos componentes RGB da imagem e só efetua algum ajuste se houver um ligeiro predomínio de algum deles - se você apontar a câmera neste modo para o céu azul tenha certeza de que ela não irá torná-lo branco.
Outro tipo de ajuste, também não muito preciso, é feito apontando-se a câmera para a cena e cobrindo-se as lentes da mesma com uma tampa de objetiva translúcida (leitosa). A seguir, pressiona-se o botão white balance. Excesso de uma cor ou outra na cena irá no entanto atrapalhar este tipo de ajuste.
E existem os modos pré-fixados de ajuste, que já vem "prontos de fábrica": indoor, outdoor, fluorescent, etc..., que podem ser utilizados quando não houver tempo para um ajuste mais preciso. Seja qual for o ajuste, o caminho para obter-se imagens com cores mais próximas da realidade (e camisas brancas! ) passa pelo white balance, o ajuste do branco. _____________________________________________________________________
Todas as cores podem ser obtidas a partir das cores básicas RGB - Red, Green, Blue. A faixa azulada na pintura do ônibus possui muito azul e pouco vermelho e verde, por isso a mesma aparece escura na segunda e terceira imagens e clara na última. O branco, por sua vez, é formado por proporções iguais destas três cores.
As xícaras de café foram gravadas com uma câmera Mini-DV. Nas três primeiras imagens a iluminação foi feita com luz fluorescente comum. Na imagem 1, a regulagem outdoor da câmera diminuiu o azul, fato que somado ao excesso de verde/azul da luz fluorescente resultou no tom ligeiramente rosado. Na imagem 2, a regulagem indoor da câmera diminuiu o vermelho, que associado ao verde azulado da iluminação resultou em um azul ressaltado. A imagem 3 mostra a cor real das xícaras: foi batido o branco. Nas duas últimas imagens a iluminação foi mudada para luz incandescente. Na imagem 4, a diminuição do azul acarretada pela regulagem outdoor somada ao excesso de vermelho da luz incandescente resultou no tom alaranjado. Na imagem 5 a combinação estava correta: ajuste indoor com luz incandescente. A cor melhorou, mas o ajuste pré-fixado da câmera não consegue superar a precisão do ajuste manual da imagem 6, onde novamente foi batido o branco.