A noção de se poder editar um filme perde-se no tempo: muito provavelmente ligada à possibilidade de juntar e colar dois pedaços de película cinematográfica, trouxe para o cinema a capacidade de dominar o tempo e a realidade à vontade. Tudo de forma simples, a partir de um aparelho onde, para localizar as cenas a serem cortadas / emendadas, bastava simplesmente olhá-las: contar quadros era contar fotogramas ou perfurações a olho nu. Rapidamente a edição dos filmes transformou-se em uma arte, a arte de contar histórias.

Veio então a TV e alguns anos mais tarde, o registro de suas imagens em fitas magnéticas: o famoso videotape. Só que agora, essa fita trazia um problema: as imagens registradas não mais podiam ser vistas; como então efetuar um corte em determinada cena? Nessa época já existiam os gravadores de áudio em fita, e estes utilizavam um contador mecânico de metragem de fita percorrida sobre a cabeça de áudio. Não se pensava ainda em marcar com precisão o tempo da gravação e sim em dar aos usuários a possibilidade de pelo menos localizar aproximadamente onde iniciava-se por exemplo uma determinada música dentro da fita.

O contador mecânico foi o primeiro indicador de localização empregado nos aparelhos de videotape. Logicamente, devido a problemas diversos de precisão nos mecanismos, invariavelmente a fita acabava sempre parando um pouco antes ou um pouco depois do ponto desejado. Isso sem falar que era uma localização indireta, ou seja, a imagem era mostrada em um monitor e lida em um outro aparelho, através de uma fita visualmente sem imagem alguma. Essa impossibilidade de se "pegar" a imagem como se fazia no negativo cinematográfico causou também resistências ao seu uso por diversos editores consagrados, com bastante prática em cinema.

Sai de cena o contador mecânico e entra o eletrônico: no início da década de 60 surge a gravação de pulsos magnéticos gravados regularmente na borda das fitas, espaçados milimetricamente uns dos outros. Uma cabeça de leitura especial para lê-los e gravá-los foi acrescentada, conectada a um circuito que fazia a contagem dos mesmos. Essa é a indicação dos videocassetes VHS, marcando o decurso do tempo na fita na forma HH:MM:SS, algo mais preciso do que o contador mecânico de antes.

Mas o processo também não era livre de problemas: ao rebobinar para frente ou para trás a fita, nas conhecidas operações FF / RW, a referida cabeça tinha que manter contato com a superfície da fita e efetuar a leitura do mesmo modo, embora agora em velocidade bem maior. O resultado era a perda frequente de informação (pulsos não contados por falhas nesse contato) e com isso, de precisão.

Mas, ainda que fosse melhorado e ficasse livre desses problemas, ainda não permitia a edição com cortes de maior precisão, como se fazia em cinema, onde era possível ter acesso individual a um único fotograma.

O vídeo, assim como o filme, é composto por uma sequência de diferentes imagens que vão-se sucedendo à vista do espectador: no cinema 24 imagens, no vídeo e na TV 25, 30 ou 60 imagens (dependendo do sistema utilizado). Essas imagens denominam-se, em vídeo e TV, quadros. Pois para se ter o mesmo nível de precisão que havia na edição feita em cinema, era preciso ter-se acesso aos quadros do vídeo. Para isso era preciso contá-los e para contá-los era preciso criar-se um outro sistema, que além de registrar HH:MM:SS também registrasse a quantidade de quadros dentro de cada segundo, algo como HH:MM:SS:QQ.

Algo que foi resolvido no final da década de 60: nascia o Time Code, padronizado no início da década seguinte pela organização americana SMPTE (Society of Motion Picture and Television Engineers) e pela organização européia EBU (European Broadcast Union). A padronização através de duas organizações diferentes deveu-se a diferenças técnicas entre padrões americanos e europeus (NTSC / PAL), como a quantidade de quadros por segundo (30 / 25 respectivamente), nascendo daí referências como "SMPTE Time Code" por exemplo.

O sistema de numeração proposto segue o princípio de um relógio digital: assim como no primeiro minuto do dia a hora é representada por "00", no último minuto do dia a hora é representada por "23". O intervalo das 24 horas do dia pode então ser representado por "00" / "01" / "02" ... "23". Analogamente, os minutos e os segundos também são numerados de "00" a "59".O intervalo de numeração dos quadros ("QQ" no exemplo acima) depende do formato utilizado. No sistema NTSC, que trabalha com 30 quadros/segundo, QQ vai de "00" a "29"; no sistema PAL europeu por exemplo, que trabalha com 25 quadros/segundo, QQ vai de "00" a "24". Assim, não existe o quadro "30" em NTSC nem o quadro "25" em PAL europeu.

O primeiro quadro é sempre o quadro 00:00:00:00, o segundo quadro 00:00:00:01, e assim por diante. No processo de edição, efetuar um corte para separar um trecho com uma hora de duração significa cortar logo após o quadro 00:59:59:29, iniciando no quadro seguinte, o 01:00:00:00.

O SMPTE Time Code permite a escolha (disponível em algumas câmeras, sobretudo do segmento profissional) da forma de se gerar essa numeração. Na forma Record Run (mais comum) é registrado o tempo decorrido de gravação na fita, contado em horas, minutos, segundos e quadros. Na forma Free Run (ou Time of Day) a parte horas / minutos / segundos da numeração é obtida a partir de um relógio digital existente na câmera, sempre em funcionamento, independentemente de estar sendo feita ou não alguma gravação. Este tipo de Time Code é útil na sincronização de várias câmeras em um evento por exemplo. O relógio interno das câmeras é sincronizado entre elas e a partir deste momento, mesmo que existam interrupções ou até troca de fitas e cartões nas câmeras, no momento da edição é possível sincronizar as várias fontes da mesma imagem.

Outra forma é a denominada User Set, onde é possível informar para a câmera o valor inicial a ser considerado para HH:MM:SS:QQ; neste modo, ao invés da digitação da hora real, é usual inserir-se um número em "HH" representando por exemplo o número da fita utilizada na câmera no momento ou outra informação qualquer. Em eventos multi-câmeras que não exijam sincronismo absoluto entre elas pode-se informar manualmente a hora e minuto do momento: mais tarde o editor terá facilidade em localizar os diferentes conteúdos.

Na forma External o Time Code é obtido não do relógio digital da câmera e sim de uma fonte externa geradora de Time Code, sendo utilizado geralmente em situações (estúdios por exemplo) onde mais de uma câmera esteja atuando. Na forma Jam-Sync (utilizada juntamente com a forma Free Run) o relógio digital da câmera é inicializado através de uma fonte externa geradora de Time Code, sendo a seguir a conexão entre esta fonte e a câmera desfeita.

Mas o Time Code não registra somente a informação da contagem dos quadros: outros conteúdos são ali armazenados, um deles, denominado Userbits. Além da informação de sua numeração, cada quadro do vídeo permite o registro adicional de 32bits de dados, cujo conteúdo é decidido pelo usuário, daí o nome Userbits. São 8 números ou 4 letras quaisquer, sendo esse conteúdo escolhido através de opções específicas dos menus das câmeras - recurso normalmente existente somente nas câmeras do segmento semi e profissional.

Assim por exemplo é possível escolher a data e hora da gravação, obtida do relógio da câmera, para ser registrada ali, informação esta que não se sobrepõe à do próprio Time Code: como visto acima, a informação HH:MM:SS no Time Code na maioria das vezes não é escolhida pelos usuários como hora real. Quando o conteúdo é levado para edição, juntamente com ele irão estes dados. Ou então escrever ali, através geralmente de um teclado gerado por botões na câmera, pequenos textos identificando a cena, mesmo que este ultrapasse o espaço de um único quadro (somente 4 letras por quadro). Ou outra informação qualquer que se deseje registrar ali. Geralmente esse tipo de menu oferece a gravação de conteúdo fixo pela câmera (caso da data/hora por exemplo) ou deixa-a a cargo do usuário.

E por falar em contagem de quadros, ela possui uma ligeira diferenciação quando se fala em sistema NTSC. Este sistema foi criado nos EUA na década de 40 com exatamente 30 quadros por segundo. Porém, quando mais tarde experiências foram feitas para se colocar em prática a imagem colorida, dificuldades técnicas surgiram para fazer o sinal colorido ser capturado pelas TVs P&B da época sem problemas. Não foi possível encontrar uma solução satisfatória a não ser alterar essa quantidade de quadros, que deixou de ser 30/seg e passou a ser 27,97/seg. Essa modificação reflete-se diretamente no Time Code, que nesse sistema, não conta o tempo da mesma forma que o tempo real. Isso acontece porque se a velocidade de uma fita no aparelho é um pouco menor (29,97/qps), o instante em que a indicação por exemplo de 1 minuto decorrido aparecer acontecerá na realidade em um tempo superior ao tempo de 1 minuto real. Emissoras de TV tem tempos rigorosamente distribuídos - para comerciais por exemplo, e esse problema dificultaria o cálculo do tempo de gravação, já que o indicado no Time Code não corresponde à realidade.

Surge assim, para o sistema NTSC, as opções Drop Frame Time Code e Non-Drop Frame Time Code. São apenas duas opções de numeração diferentes dos quadros: na opção Drop Frame, de tempos em tempos a numeração "dá um salto" para frente, para acompanhar a numeração de um relógio real. Assim, a diferença entre o tempo numerado no Time Code (HH:MM:SS:QQ) e o real torna-se praticamente a mesma (dependendo do ponto do corte a variação é insignificante). Na opção Non-Drop Frame Time Code a numeração segue de forma contínua, sem interrupção - e não bate com a real. No momento da gravação é possível selecionar-se estas opções no menu da câmera. E é importante lembrar que somente a numeração é truncada, não, obviamente, os quadros ali existentes.

Assim, vemos que de um início bem primitivo, onde causava sensação na edição os quadros não poderem ser vistos como no cinema, a edição em vídeo deixou a edição em película para trás, trazendo muitas outras possibilidades de manipulação de conteúdo.