Em uma matéria na imprensa avaliando a qualidade das salas de cinema um dos quesitos era a projeção; em determinada sala o avaliador anotou ponto negativo para este item. O motivo: o filme a que ele assistiu não ocupava todo o tamanho da tela, sobravam margens escuras à esquerda e à direita. No hotel, invariavelmente a moderna TV de tela larga, no formato 16:9 está sempre ajustada, no menu, para esticar lateralmente sinais transmitidos no formato padrão 4:3. Esse ajuste visa contemplar os hóspedes, eles mesmos, não poucos, adeptos do efeito que distorce as reais proporções de cabeças e demais objetos, na tentativa de fugir das barras escuras laterais.

São apenas alguns exemplos que mostram que as diferentes proporções das imagens, notadamente as duas mais utilizadas em vídeo, 4:3 e 16:9, ainda são assunto mal compreendido. Se no âmbito do vídeo e da TV a situação ainda é mais fácil de ser compreendida, por existirem somente essas duas proporções, em cinema tudo complica-se ainda mais. Hoje em dia a quase totalidade dos filmes tradicionais é apresentada nas salas dos cinemas em 3 diferentes proporções de imagem, a mais larga delas (2,35:1) correspondendo à proporção real da tela - daí o motivo da tela nem sempre ser totalmente preenchida, uma característica de escolha adotada em determinado filme e não um defeito de projeção do cinema.

Fora essas três proporções atualmente utilizadas, o cinema desde seus primórdios empregou uma variedade que poderia ser classificada na casa das dezenas de formatos e tipos diferentes de película e área de registro de imagem. O mesmo não aconteceu na TV, um meio eletrônico bastante limitado quando o assunto são mudanças que afetam suas características técnicas. Algumas modificações até podem ser feitas, como foram as melhorias introduzidas no sistema NTSC para melhorar a reprodução de cores, ou a introdução do áudio estéreo, o Close Caption e a própria transição da TV P&B para o formato colorido. No entanto, alterações radicais, como mudar o tamanho da proporção de imagem nas telas são praticamente impossíveis, pois teria-se que trocar todo um sistema existente por outro, incluindo os televisores utilizados por um imenso público. Foi o que aconteceu com a TV de alta definição.

Ao redesenhar-se a TV, criando algo totalmente novo foi possível aproveitar o momento e alterar a antiga proporção 4:3 a anos utilizada, herdada na verdade do cinema tradicional, que ainda não conhecia a tela larga, como o Cinemascope e outras dezenas de formatos. Na época da criação da TV, quando existiam já milhares de horas de filmes prontos, a quase total maioria na proporção muito próxima de 4:3 de imagem, não faria sentido criar o retângulo do tubo de imagem com tamanho diferente deste.

Mas o cinema ao sofrer a forte concorrência da TV foi forçado a criar algo que atraísse novamente o público perdido para a telinha. Diversas experiências foram então feitas, incluindo o citado Cinemascope, algo que a TV, restrita ao padrão de suas centenas de toneladas de equipamentos espalhados em estúdios e casas de expectadores não poderia fazer. Muitos desses formatos tiveram vida breve, alguns até mesmo somente com o lançamento de um único filme. Outros, como o Cinerama, sobreviveram por mais tempo.

Com a chegada do HD a TV pôde finalmente "se atualizar" trazendo uma tela mais larga e é importante deixar claro este conceito: todo material captado em HD possui a proporção 16:9, nativa inclusive em muitos sensores (CCDs/CMOSs) das câmeras de vídeo. Não por muito tempo: o cinema, em resposta, "ressuscitou" a técnica do 3D, experimentada diversas vezes no passado, com relativo sucesso, mas agora, "temperada" com a qualidade dos processos digitais. A indústria da TV já oferece contrapartida, com televisores 3D com ou sem o uso de óculos especiais.

O resultado disso tudo é que a tela larga, 16:9 dos televisores modernos, não "resolveu" o problema da questão dos diferentes formatos de imagem e nem poderia: é impossível "enquadrar" tudo o que foi feito até hoje em uma mesma dimensão geométrica. Se pensarmos em fotografia, onde a diversidade de padrões é ainda maior e se considerarmos que os televisores mostram atualmente não somente vídeos mas também fotos e ainda que há uma convergência futura para internet e TV compartilharem o mesmo conteúdo, veremos que a convivência com a diversidade de padrões é algo que deveremos sempre ter em mente como natural.

No próprio âmbito dos televisores, já existem telas no formato 2,33:1, praticamente o mesmo formato de tela mais larga atualmente empregado nos cinemas. Com esse televisor, assistir um desses filmes - e não são poucos - é uma experiência que não deixa, literalmente, margem nenhuma a dúvidas: não existem barras escuras nem dos lados nem acima e abaixo. Mas basta clicar no controle remoto para ver a transmissão de um jogo de futebol no novíssimo padrão HDTV, que usa 16:9, para as barras surgirem, e mais largas ainda se aparecer na tela o velho e celebrado Charles Chaplin.

E como fazer com todo o legado produzido até hoje, praticamente nada em 3D e sim em 2D? E os vídeos de internet, com diversos formatos de janelas? O resultado é que devemos nos acostumar com essas diferenças, talvez algo melhor do que tentar "enquadrar" formatos, como os processos digitais para criar efeitos que criam versões 3D a partir de originais 2D ou as opções de menu dos televisores para distorcer imagens e com isso ocupar a tela toda.

Além das diferenças de proporções de imagem, a quantidade de codecs de áudio e vídeo mundo afora é muito grande, assim como a quantidade de idiomas, tão impossíveis de serem unificados quanto impraticável é unificar as voltagens elétricas nos diferentes países: se antes havia o PAL 50Hz e o PAL 60Hz, agora tem-se os formatos HD também em 50 ou 60Hz, condição exigida para apresentar o imenso legado produzido até hoje em 25 e 30qps. Somando-se o 24p (progressivo) e as antigas (SD) e novas (HD) imagens entrelaçadas, tem-se também como se vê, variações não só no formato como também no sinal que representa essas imagens.

Assim, a direção prevista para os próximos anos é a capacidade cada vez maior de "tradução" dessas diferentes "linguagens" de imagens, possibilitando a construção de dispositivos que possam exibir cada vez mais formatos diferentes. Na questão do áudio, dispositivos de tradução simultânea automática já são realidade, ainda que de forma restrita e um tanto experimental. O futuro no entanto trará sua presença sob a forma de legendas criadas e apresentadas em tempo real nesses dispositivos, dentro do crescente processo de globalização.

São esperadas para o futuro novas tecnologias para além do HD 16:9 e do 3D, com outras proporções de imagem: Takayuki Ito, especialista do laboratório de ciência e pesquisa em tecnologia da emissora japonesa NHK prevê um formato de super alta definição, onde os telespectadores terão telas que cobrirão uma parede inteira de suas casas, com grande ângulo de visão lateral e ainda mais definição do que a atual HDTV. Nessas telas, ver os conteúdos produzidos com as atuais tecnologias de que dispomos terá com certeza a mesma sensação que se tem hoje ao ver Chaplin caminhando pela pequena janela 4:3 e suas inevitáveis barras escuras dos lados...