Com o término da montagem da ISS - International Space Station, a estação montada através de dezenas de viagens espaciais ao longo dos últimos anos a Terra terá, como já vem ocorrendo mesmo durante sua fase de construção, um laboratório para diversas pesquisas científicas localizado na chamada órbita baixa, a centenas de quilômetros de altitude de onde vivemos nosso dia a dia.

A ausência de gravidade percebida a bordo é um dos fatores que propicia o estudo e desenvolvimento de novos compostos, estruturas químicas que fornecem depois fórmulas para a fabricação, em terra, entre outros, de remédios e outras substâncias de interesse comercial e científico. Algumas coisas nesse ambiente são muito diferentes das que ocorrem conosco aqui em baixo na superfície onde vivemos, como por exemplo a sensação de "frio na barriga" que sentimos durante segundos em descidas rápidas em direção ao solo, como bungee jumping - para os astronautas é uma sensação permanente. Outra é o fato dos astronautas observarem o nascer e o pôr-do-Sol diversas vezes ao dia... A estação possui janelas através das quais entra a luz do Sol - naturalmente filtrada em seus raios mais nocivos - e aqui, para as pessoas acostumadas com foto, vídeo e cinema, outra diferença: não existe necessidade de "bater o branco".

Essa necessidade decorre de vivermos na superfície do planeta, recoberta por uma camada, na baixa atmosfera, composta por diversas partículas em suspensão: microscópicas, essas "poeiras" de diversas origens, naturais ou artificiais agem como um filtro na luz solar que nos ilumina. Essa luz, como mostrou Newton séculos atrás, compõe-se de diversos matizes de diferentes cores, na verdade as cores que vemos no arco-íris e que, somadas, resultam na cor branca.

Ocorre que algumas cores atravessam com mais facilidade essa camada de 'poeira', outras não, o que resulta em sua filtragem - em outras palavras e exemplificando com as cores, o azul possui grande dificuldade de vencer esse trajeto e quanto maior ele for, menos azul haverá na luz resultante. Observando a dinâmica do movimento do Sol em relação à Terra perceberemos que no início do dia e em seu final a luz solar percorre um trecho maior até chegar a nós, daí sua luz ser predominantemente alaranjada nesses momentos, diferentemente do que ocorre com o chamado "Sol a pino" do meio-dia.

O resultado disso tudo são imagens com tonalidades diferentes quando gravadas ao longo do dia (algo inexistente na estação espacial...) e a necessidade de corrigir esses 'defeitos' se quisermos que a tonalidade da luz seja a mesma sempre.

Para fazer isso é preciso filtrar o excesso de luz na tonalidade que não queremos, ou seja, ressaltar o azul quando há excesso de laranja e vice-versa.

Se isso ocorre na iluminação natural propiciada pelo Sol, também ocorre na artificial, criada com refletores e lâmpadas comuns. Sabe-se que a luz incandescente é uma luz mais alaranjada e a luz fluorescente comum mais esverdeada. Novamente, precisamos filtrar esses excessos se não forem desejados.

Essa filtragem pode ser feita de diferentes formas, eletronicamente na câmera (de modo automático, semi-automático ou manual, este último chamado "batimento do branco"), eletronicamente na pós-produção ou no local, com o uso de folhas plásticas coloridas especiais, chamadas gelatinas, nome que provém do material com que eram no passado fabricadas. Muitas vezes utilizam-se os 3 processos combinados, para melhores resultados.

Como quem tem experiência na área sabe não é uma folha plástica colorida qualquer, mas sim fabricada com material especial, muito resistente ao calor das lâmpadas, em cores e tonalidades cuidadosamente graduadas e numeradas. Apesar de existirem dezenas de graduações de tonalidades e dezenas de cores de gelatinas, as mais utilizadas e mais comuns são as alaranjadas - que corrigem o excesso de azul e as azuladas, que corrigem o excesso de laranja.

As primeiras, denominadas CTO (Color Temperature Orange) podem recobrir por exemplo uma janela por onde entra a luz do dia - que é predominantemente azulada, para aproximá-la da luz usada no interior do local, se esta luz é fornecida por luzes incandescentes - que são predominantemente alaranjadas. Obviamente existem variações nessa simples proposição, como a intensidade do tom laranja dessa luz incandescente, variando, entre outros fatores, com sua intensidade e podendo ir do ligeiramente amarelado até o fortemente laranja, etc.. mas são ajustes finos efetuados no local com as mesmas gelatinas. Isso porque elas são comercializadas em gradações e pode-se acrescentar mais de uma folha sobre a outra para reforçar sua intensidade de cor, ou então usar uma folha naturalmente de cor mais intensa. O mesmo vale para a gelatina CTB.

Há ainda um tipo comum de gelatina depois das CTB/CTO: são as que somente reduzem a intensidade da luz, sem alterar sua coloração. Denominam-se ND, de Neutral Density, também encontradas em diversas graduações de intensidade. E ainda outras em cor magenta para corrigir a luz com excesso de verde das lâmpadas fluorescentes comuns, encontradas em escritórios por exemplo.

A seguir, algumas dicas no uso de gelatinas.

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A forma correta de fixar-se uma folha de gelatina na frente de um refletor é curvando suas bordas de maneira a prendê-las com clips especiais (ou prendedores de roupa de varal, desde que de madeira, por causa do calor gerado) nos barndoors, as placas de metal que servem para direcionar a luz do refletor. A fixação nos barndoors tem a vantagem de evitar que se recorte a folha, permitindo sua utilização em outras ocasiões, uma vez que pedaços maiores podem ser usados.

Ao efetuar gravações em salas e escritórios com grandes áreas envidraçadas, é possível deparar-se com vidros de tonalidade ligeiramente esverdeada, como os vidros do tipo rayban. Às vezes o tom esverdeado pode ser muito sutil, e, como a vista humana adapta-se facilmente a situações de variação de temperatura de luz, a situação pode passar desapercebida. A prática de fazer sempre o ajuste do branco evita surpresas desse tipo.

Filtro ND: ao contrário do que se possa imaginar, nem sempre quanto mais luz, melhor: nesta situação, as cores claras começam a ficar saturadas e a imagem perde em definição. Para contornar este problema, comum em ambientes muito claros (praia, neve por exemplo) geralmente utiliza-se filtros do tipo ND sobre a objetiva da câmera ou então os internos existentes em muitas câmeras. O mesmo efeito, se a situação é por exemplo uma sala muito clara - prédio alto com muitas janelas envidraçadas pode ser obtido afixando-se gelatinas ND sobre o vidro das janelas.

Em ambientes com diferentes tipos de luz (luz do dia e luz incandescente por exemplo) na maioria das vezes existirão sempre as duas opções, ou corrigir uma luz ou corrigir a outra. Assim por exemplo, pode-se ter uma sala iluminada por luzes incandescentes e pela luz do dia que entra através de uma janela, sendo necessário igualar as temperaturas das luzes na cena. Gelatinas coloridas permitem fazer isso, de duas formas diferentes. Uma delas é recobrir as janelas com gelatinas alaranjadas (do tipo CTO - Color Temperature Orange). A outra, instalar gelatinas azuladas (do tipo CTB - Color Temperature Blue) sobre as luzes incandescentes internas. Como o efeito final é o mesmo, a decisão pode-se basear no custo-benefício, ou seja, na quantidade de gelatina a ser utilizada em uma abordagem ou outra, no tempo dispendido na montagem de uma forma ou de outra e ainda na disponibilidade de acesso a uma montagem ou outra, referindo-se aqui a dificuldades de acesso às luzes ou às janelas.

Quando existem persianas ou cortinas nas janelas a fixação de gelatinas para correção de cor é facilitada por um truque: não é necessário recobrir toda a superfície da mesma com as folhas, a parte superior pode ser encoberta abaixando-se ligeiramente a persiana ou então as partes laterais, fechando-se ligeiramente as cortinas.

Câmeras do segmento consumidor algumas vezes trazem uma pequena luz embutida no corpo da mesma. Outras, do segmento semi-profissional, possuem suportes para a instalação de kits de iluminação, normalmente um refletor fixado acima das lentes da câmera. Em algumas situações, essas luzes podem ser utilizadas em locais (exteriores) onde há muita luz, porém não exatamente onde se quer. Um exemplo é o da pessoa em um dia claro, sob a sombra de uma árvore. A luz da câmera suplementa a luz natural, eliminando sombras causadas por esta. No entanto deve ser lembrado que a maioria desses refletores utiliza lâmpadas ajustadas para uso em interiores, ou seja, em temperaturas de cor próximas de 3.200 graus Kelvin (correspondente à tonalidade alaranjada). Assim, para não causar distorção nas cores da imagem sendo gravada, é aconselhável o uso de uma na cor azul, para aumentar a temperatura de cor da luz do refletor, tornando-a mais próxima da temperatura da luz do dia (em torno de 5.600 K na maior parte do dia, excetuando-se o início e o fim do dia, como visto acima).

Vivemos na superfície do planeta, repleto de diferentes tipos de luzes, naturais e artificiais. Aprendemos dicas básicas para ajuste e correção de alguns problemas. Mas devemos nos lembrar ainda, que uma fonte de luz pode ter sua coloração alterada quando é refletida por uma superfície colorida, caso de uma parede verde por exemplo. Por isso, além do uso das gelatinas é sempre imprescindível fazer o ajuste do branco a todo momento em que a câmera muda de posição ou que as condições de iluminação no local mudam.

Dizem que Shakespeare utilizou um vidro contendo vinho para criar uma fonte de luz vermelha em seu teatro. Naquela época, se isso foi feito, ainda que com as enormes restrições de equipamentos de luz existentes, baseados em lamparinas, hoje o universo que se nos apresenta é muito rico em possibilidades, como podemos comprovar ao visitar uma loja especializada ou um site de referência ao escolher gelatinas para equilibrar as cores de nossas luzes.