A Copa do Mundo de 2006 entrou para a história como a primeira a ser transmitida em alta definição (HD): a empresa responsável pela transmissão, a Host Broadcast Services, espalhou 25 câmeras por jogo, posicionadas em diversos pontos estratégicos através do campo. No entanto, nenhuma diferença pôde ser notada através dos milhares de televisores espalhados pelo país: tanto fazia se o televisor era uma tela de plasma de alta definição ou o velho televisor de 12 polegadas instalada sobre o armário da cozinha.

As imagens de um casamento registradas com uma câmera HDV, ao serem autoradas em um DVD não apresentam nenhuma diferença com as imagens do mesmo evento capturadas com uma câmera Mini-DV de 3CCDs topo de linha.

O que explica esses dois fatos e outros mais é o correto entendimento do significado de HD e SD, as siglas utilizadas para High Definition e Standard Definition.

Origem

Boa parte das imagens que vemos na mídia são formadas pela junção de minúsculos pontos (pixels), que quando vistos de uma certa distância passam a aparecer como um todo contínuo. Isso acontece na imprensa, na fotografia tradicional e na digital. Dizemos por exemplo que uma foto digital tem 640 x 480 pixels e outra 1600 x 1200 pixels. E em vídeo ocorre o mesmo. Mas então, de onde vem o termo "linhas", frequentemente utilizado em vídeo?

Esse termo tem sua origem no vídeo analógico: na época em que a TV foi criada, transmissões de som pelo ar (rádio) já eram feitas a muito tempo, mas transmitir uma imagem apresentava um desafio inteiramente novo. Como é impossível transmitir uma imagem por completo, a solução encontrada foi cortá-la em pedaços, mais precisamente, em linhas. Algo como fatiar uma foto com o auxílio de uma tesoura, em diversas tiras finas horizontais.

Imaginando essa imagem desenhada sobre um mosaico de pastilhas, uma ao lado da outra, formando fileiras regulares, uma abaixo da outra, poderemos considerar cada pastilha como um pixel, podendo apresentar tonalidades variáveis do branco ao preto (para uma imagem em P&B). Podemos então visualizar cada tira cortada com tesoura como sendo uma dessas fileiras de pixels. Cada uma dessas fileiras (ou "tira") é uma linha da imagem do vídeo.

O sinal de TV que ia para o ar consistia então, basicamente - e de maneira simplificada - em uma série de linhas, transmitidas uma após a outra até completar toda a área da imagem. Do outro lado existia um aparelho receptor de TV, contendo um tubo de imagem que, através de um canhão de elétrons, ia desenhando essas linhas na tela, de alto a baixo.

Limitações técnicas do início dos anos 50 fizeram com que a imagem na realidade não fosse transmitida e montada linha após linha, uma abaixo da outra, e sim de maneira alternada: todas as linhas ímpares, depois todas as pares, depois todas as ímpares do quadro seguinte, e assim por diante. Enquanto o cinema exibia 24 quadros/segundo, este sistema, o primeiro sistema de vídeo a ser criado (NTSC) exibia 30 quadros/segundo.

Ao conjunto isolado de todas as linhas pares ou então de todas as linhas ímpares denominou-se campo (campo par / campo ímpar) e o sistema ficou conhecido como sistema entrelaçado (interlaced). O sistema NTSC foi então definido trabalhando com campos alternados de 262 linhas e meia, totalizando 525 linhas. Destas, somente 483 eram visíveis na tela, as restantes 21 de cada campo destinavam-se ao armazenamento de instruções de controle para o receptor de TV, orientando-o sobre a forma de desenhar as linhas na tela, marcando o final de cada linha, o início de cada novo quadro e outras informações.

Esse sistema sofreu algumas alterações com o passar do tempo, mas sua estrutura básica permanece a mesma até hoje. Como variações surgiram depois o sistema PAL e o SECAM. O PAL trabalha com 50 quadros por segundo e 625 linhas (o nosso PAL-M foge a regra, ao utilizar 30 quadros e 525 linhas) e o SECAM segue a mesma linha, também tendo suas exceções (em alguns países são utilizados 30 quadros).

De analógico para digital

A chegada dos formatos digitais, como a família DV (Mini-DV, DVCAM, Digital-8 e DVCPRO), foi precedida por normas internacionais estabelecendo padrões a serem seguidos. Assim, no padrão NTSC o sistema DV utiliza 480 linhas ao invés das 525 originais. Com a digitalização, perdem função as 42 linhas de controle, restando as 483 visíveis, das quais 3 foram suprimidas.

A digitalização permitiu também o surgimento de equipamentos trabalhando com o desenho sequencial das linhas, ao invés de utilizar o modo interlaced. Este modo, denominado progressive scan (desenho progressivo das linhas, uma após a outra) passou a ser empregado como opção em algumas câmeras, gerando formatos fora do padrão, como o que usa 30 quadros completos por segundo. Ao invés de 30 campos de linhas pares + 30 campos de linhas ímpares, tem-se 30 campos completos desenhados em 1 segundo. E também em alguns televisores, ou exibindo este conteúdo progressivo original, ou simulando-o através de artifícios eletrônicos a partir de conteúdo comum não-progressivo. Imagens em progressive scan apresentam-se com maior qualidade visual do que as interlaced.

As 480 linhas, no padrão NTSC, referem-se à resolução vertical. E a horizontal? A norma que definiu o DV estabeleceu 720 pixels como padrão de resolução máxima para este formato. Isso significa que enquanto a resolução vertical permanece fixa, a horizontal pode variar, o que explica, entre outros fatores, diferentes resoluções de imagem para diferentes câmeras Mini-DV. O padrão DV portanto é definido com resolução de 480 x 720 pixels.

Esta resolução é bem menor do que a empregada nos diversos sistemas HDTV (High Definition Television) em uso e em implantação em diversos países. Nestes sistemas é comum a apresentação de imagens com grande quantidade de pixels, como 1280 x 1920. Isso levou aos conceitos de SD e HD, para separar os grupos de sistemas tradicionais e os de alta definição.

Com a propagação cada vez maior de televisores com capacidade de exibir imagens HD em países onde a HDTV já havia sido implantada, surgiu uma necessidade não suprida pelos sistemas tradicionais HDTV: os usuários domésticos. Estes não podiam gerar conteúdo HD de uso próprio para visualizar em suas TVs de alta definição, devido ao custo altíssimo dos equipamentos profissionais (câmeras) até então existentes. Não havia um formato como o Mini-DV, porém de alta definição. Pensando inicialmente nesse nicho e também no segmento semi-profissional, foi criado em 2003 o formato HDV, proposto originalmente pela JVC com adesão posterior da Canon, Sharp e Sony.

HDV

Ao contrário dos sistemas convencionais, onde a imagem possui a proporção 4x3, no HDV a proporção de cada quadro é 16x9. Esta proporção, a mesma utilizada nos sistemas de HDTV, aproxima-se de algumas proporções de quadro utilizadas em cinema. Embora seu sinal possa ser exibido em TVs comuns do tipo SD, seu objetivo é exibir uma imagem de alta resolução em TVs de alta definição. Em equipamentos comuns o efeito é o mesmo que assistir a uma transmissão em HD de um evento: as linhas extras são desperdiçadas e a imagem não difere da imagem tradicional.

É um formato aberto como o DV, ou seja, uma fita gravada em HDV pode ser reproduzida em equipamentos HDV de diferentes fabricantes.

O formato HDV possui 2 subdivisões: HD1 e HD2. No primeiro as linhas são montadas uma após uma, no modo progressivo descrito acima. No segundo, são montadas no modo interlaced, com campos pares e ímpares. O HD1 trabalha com 720 linhas e possui 1280 pixels de resolução horizontal, ou seja, cada quadro HD1 é do tipo 720 x 1280. O HD2 trabalha com um número maior de linhas, 1080, e resolução horizontal de 1440 pixels, ou seja, 1080 x 1440. Como vimos, imagens progressivas tem maior qualidade do que as interlaced, porém como o HD2 trabalha com maior número de linhas uma coisa compensa outra e tanto um como outro possuem qualidade equivalente. O frame rate (quantidade de quadros / segundo) utilizado no HD1 pode ser de 30 ou 60 e no HD2 é fixo, sempre 30.

Os fabricantes tem-se dividido entre um e outro subformato, criando até variações próprias. A primeira câmera HDV foi a GR-HD1: lançada em 2003 pela JVC utilizava HVD do tipo HD1. A Sony optou pelo tipo HD2 com seu primeiro lançamento em 2004: a HDR-FX1. Ambas destinadas ao segmento consumidor, foram sucedidas posteriormente por modelos visando o público semi-profissional: HD10U da JVC e HDR-Z1N da Sony. Em 2005 a JVC inovou com uma implementação própria do HDV (denominada ProHD), oferecendo a opção de se gravar no tipo HD1 em 24 quadros / segundo ao invés de 30.

O HDV é gravado no mesmo tipo de fita que o Mini-DV, uma estratégia para reduzir custos e aumentar as possibilidades de expansão. Assim, a rigor não existem "fitas HDV": fitas comercializadas como "HDV" são na verdade fitas Mini-DV fabricadas com processos mais elaborados para diminuir eventuais ocorrências de falhas (dropouts) e assim aumentar a qualidade final da imagem: suas câmeras aceitam os dois tipos de fita. Cada fita armazena 63 minutos de imagem.

O segredo para utilizar a mesma fita de um sistema SD (MIni-DV) e conseguir armazenar o mesmo tempo de conteúdo HD é o tipo de compressão utilizada: MPEG2 - ou, mais precisamente, uma implementação especial desse padrão, denominada MPEG2 HDV. As altas taxas de compressão do formato MPEG2 permitem armazenar muito mais informações na fita do que no formato DV. O formato HDV é compatível com o padrão IEEE-1394: a conexão de câmeras HDV a computadores é feita através do mesmo cabo FireWire utilizado nos formatos DV.

Sopa de letras

O formato HDV acrescentou mais siglas às já utilizadas normalmente para referenciar diversos tipos de padrões de vídeo. Mas, somente com o que já foi comentado até aqui, já temos plenas condições de "decifrá-las":

720/24p - o formato ProHD do HDV acima citado é deste tipo: emprega 720 linhas no modo progressivo (daí o "p" na sigla), com 24 quadros/segundo. A opção de 24 quadros é muito procurada por pessoas interessadas em gerar conteúdo para posterior conversão para película (transfer), devido a facilidade no processo acarretada pela coincidência de frame rate.

720/30p - HDV do tipo HD1 utilizando 30 quadros / segundo

720/60p - HDV do tipo HD1 utilizando 60 quadros / segundo

1080/30i ou, simplesmente, 1080i - HDV do tipo HD2, utilizando 30 quadros / segundo

Versões equivalentes também existem para sistemas PAL: 720/25p, 720/50p e 1080i (com 25 quadros).

Restrições

As taxas de compressão empregadas fazem com que sua imagem degrade de forma perceptível à medida em que a movimentação nas cenas e alteração de cores torne-se mais rápida. A mesma compressão também é responsável por uma uma ligeira degradação da imagem - ainda que pouco perceptível - a cada passagem pelo micro para edição do conteúdo gravado na fita. E por falar em edição, o micro necessita de mais "músculos" para trabalhar com o formato: além de processadores na faixa de 2,8 a 3.0Ghz, a quantidade de memória RAM recomendada é de no mínimo 1Gb.

Testes tem demonstrado que captar imagens HDV visando posterior down-convert para SD resulta resolução semelhante à da captura das mesmas imagens com equipamento topo de linha Mini-DV. Assim, para total aproveitamento do formato as imagens deveriam ser mantidas como HD, não SD. No entanto, há ainda uma séria restrição na forma de distribuição das imagens nessa forma: a popularização dos players HD, atrelada ao desenrolar da disputa Blu-ray x HD-DVD. Sem eles, a visualização das imagens depende da conexão direta da câmera a uma TV HD, ou então da execução do conteúdo HD para ser visualizado no micro (com o WMV-HD - Windows Media Video High Definition - por exemplo).

Por outro lado o HDV tem sido empregado com sucesso, entre outras aplicações, na captação visando transfer para película, na geração de conteúdo suplementar para emissoras que já trabalham em HD ou em trabalhos envolvendo aplicação de efeitos especiais de edição.