Computadores estão hoje associados em nossas mentes indiscutivelmente ao conceito "digital". E isso é verdade, todo processamento de informações digitais, sejam imagens, sons, textos e outras mídias é efetuado através de computadores. Essas mesmas máquinas que nossos avós viram surgir com o nome de "cérebros eletrônicos" funcionam, desde o início, com a aplicação de técnicas e conceitos bem simples da Eletrônica. Basicamente a mesma Eletrônica utilizada para montar uma placa de circuito para fazer funcionar o radinho de pilha que nossos avós também usavam está hoje dentro de um computador. Os mesmos transistores, capacitores, resistores e outros componentes que estavam ali também estão na placa mãe do micro da estação de edição. A diferença - prá lá de significativa - é que entrou em cena a miniaturização na fabricação dos circuitos impressos, propiciada inicialmente com as chamadas pastilhas de silício. Com isso, milhares e milhares desses transistores, capacitores, etc.. puderam ser colocados em uma área tão pequena como a de uma moeda de 1 centavo, permitindo a montagem de circuitos extremamente complexos.

Mas essa Eletrônica de que estamos falando não tem nada de digital e sim de analógica: um transistor não é digital. O conceito "digital" surge quando esses circuitos são colocados para manipular números, mais precisamente os famosos "0"s e "1"s, correspondentes aos estados "desligado" e "ligado". Assim nasceram os computadores, máquinas extremamente capazes de manipular esses números com incrível velocidade.

Com o surgimento dos computadores, surgiu também uma necessidade: armazenar temporariamente algumas dessas informações. Foram então desenvolvidos alguns circuitos especiais (chamados "chips", em alusão às pastilhas de silício) de memória. E um desses chips de memória foi o CCD.

Sim, o conhecido Charge Coupled Device começou como um simples chip de memória! A inovação que ele trazia era a grande facilidade de transferir e armazenar cargas elétricas em seu interior e depois recuperá-las de volta. Os dados numéricos, na forma de cargas elétricas, eram armazenados em acumuladores dispostos em fileiras, uma abaixo da outra. Um circuito eletrônico (analógico) fazia a gravação e leitura dessas cargas, lendo uma a uma, fileira após fileira, como os livros armazenados em uma estante com várias prateleiras. Daí o nome "dispositivo de cargas acopladas" (Charge Coupled Device), pois na saída, as informações vinham como os livros retirados da estante para consulta e colocados em uma mesa: uma fileira de livros, um após o outro, um ligado, "acoplado" ao outro.

A descoberta posterior no entanto de tecnologias melhores para armazenamento de dados, como o EEPROM (Electrically Erasable Programmable Read Only Memory) fez com que o CCD se tornasse obsoleto para essa função. Por outro lado, a grande facilidade de transferência de cargas elétricas do mesmo sugeriu seu aproveitamento para outra função: o registro (captura) de imagens formadas em uma grade de pixels. Nos anos 70, Boyle e Smith tiveram a idéia de montar uma grade de células fotoelétricas em miniatura, formando um mosaico. Essas células, também um componente utilizado em Eletrônica (portanto analógico), utilizavam um efeito descoberto pelo Einstein (que lhe daria o Nobel de 1905), o de transformar luz em energia elétrica.

O que Boyle e Smith pensaram foi: uma imagem é formada por uma série de pontos claros e escuros, em diversas intensidades; se montarmos um mosaico com milhares dessas células e sobre ele, com o auxílio de uma lente projetarmos a imagem, cada célula irá gerar mais ou então menos eletricidade, conforme receba ali mais ou então menos luz. O problema era: como armazenar essa eletricidade? Pensaram então em associar a cada célula um minúsculo acumulador (outro componente da Eletrônica). Aliás, cada uma desses pontos - célula recebeu o nome de pixel.

Mas faltava ainda outra parte da história: ao projetar a imagem sobre esse mosaico, cada célula iria gerar continuamente eletricidade, que por sua vez iria ser acumulada pouco a pouco nesses acumuladores. Depois de um bom tempo, todos os acumuladores estariam cheios e com isso perderia-se a diferenciação de pontos claros e escuros que formam a imagem. O que faltava era ler, rapidamente, em uma "passada" de alto a baixo, todos esses acumuladores. Boyle e Smith perceberam então que poderiam utilizar o velho chip de memória CCD associado a essas células. Ligando cada uma delas células a um acumulador de carga do próprio CCD, teria-se a vantagem da grande facilidade de leitura dessas cargas (transferência) propiciada pelo circuito eletrônico associado ao CCD, como vimos acima.

Foi criado assim um novo chip, que associava uma grade de minúsculas células fotoelétricas a um chip CCD. Com o passar do tempo, como o CCD tinha deixado de ser utilizado como memória em computadores e passava cada vez mais a ser utilizado nesta outra função - de registro de imagens, seu nome começou a ser associado a "chip de registro de imagens". O primeiro CCD para registro de imagens foi comercializado em 1973.

Daí a passar seu uso para as câmeras de vídeo - ainda analógicas na época, como as VHS, Betacam, etc... foi um pulo. Substituia-se os grandes e pesados tubos de imagem que essas câmeras utilizavam por um pequeno chip, leve e mais eficiente. O circuito eletrônico, conectado ao CCD através de fios, fazia a varredura ("leitura") das células de tempos em tempos, mais precisamente (no padrão NTSC) cerca de 60 vezes por segundo, lendo linhas alternadas (prateleiras alternadas na estante) gerando assim os campos, que combinados formavam os conhecidos 30 quadros por segundo. Para ser mais exato, embora dizemos 30 quadros por segundo, a cadência verdadeira é 29,97 quadros por segundo, "arranjo" feito pelos engenheiros para acomodar o sinal colorido no já tradicional sinal P&B, mas isso já é outra história.

Voltando a nossa história, podemos ainda dizer que, antes mesmo do desenvolvimento do velho CCD como chip de memória, um outro chip já existia: o CMOS (Complementary Metal Oxide Semiconductor). Ambos foram em uma fase inicial, empregados em circuitos de armazenamento de dados em computadores. Quando Boyle e Smith faziam experiências com a sanduíche de chips (células fotoelétricas e acumuladores) perceberam que o chip CCD de memória saía-se melhor na função proposta do que o chip CMOS. O CMOS foi então colocado de lado, embora chips sensores de imagens também tenham sido construídos posteriormente com ele. No entanto, como sua imagem foi sempre inferior (O CCD apresentou sempre uma melhor resolução dos tons de luminosidade do que o CMOS), nunca foi utilizado em câmeras de vídeo para videoprodução, tendo sido relegado ao uso em câmeras baratas de vigilância durante vários anos.

Porém o CMOS não foi completamente esquecido: uma característica sua que o CCD não possuía fez com que houvesse um contínuo interesse em um desenvolvimento futuro deste sensor: a sua resistência aos raios cósmicos. Satélites e suas câmeras seriam beneficiários diretos desta característica de resistência à radiação cósmica. Os anos passaram-se no entanto, e sua evolução continuou ainda lenta. Porém, após um período de estagnação, a tecnologia envolvida no projeto e fabricação dos CMOS repentinamente deu um salto muito grande, aproximando cada vez mais a qualidade de suas imagens da qualidade da imagem dos CCDs para aplicações semelhantes de ambos, como câmeras de vídeo comuns por exemplo. Como isso foi possível?

O funcionamento do CMOS é idêntico ao do CCD no princípio do processo de captura das imagens. Também existe ali a grade de células fotoelétricas e também existem os acumuladores de cargas associados a cada pixel (célula). A diferença começa a partir desse ponto. No CCD é um circuito eletrônico externo ao mesmo quem faz a leitura das cargas armazenadas e todo o controle desse processo de leitura. Na saída do CCD o sinal das cargas precisa ser amplificado e tratado individualmente, o que exige uma certa complexidade desse circuito eletrônico de controle. Já no desenho do CMOS este amplificador está associado individualmente a cada célula, uma a uma, ali mesmo no interior do chip de imagem. O problema é que como cada célula possui o sensor fotoelétrico, mais o acumulador e mais o amplificador, acaba necessitando de mais espaço e com isso, cabem menos células por área, ou seja, o chip tem menor resolução. Tinha.

O que propiciou o grande salto na qualidade do CMOS foi o processo de miniaturização. A limitação antes existente, agora superada, era a de conseguir confeccionar o chip CMOS com a mesma quantidade imensa de pixels existente em um CCD, no mesmo espaço, o que a tecnologia de miniaturização está sendo capaz de oferecer cada vez mais. Em aplicações especiais, chips CMOS de altíssima definição já foram empregados no lugar de CCDs no telescópio Hubble.

Ao equiparar-se com o CCD, o CMOS passa a poder ser comparado com ele e apresentar suas vantagens. Em comparação com o CCD, o chip CMOS apresenta consumo bem menor de energia (e consequentemente menor aquecimento) além de utilizar menos elementos eletrônicos (transístores por exemplo) em sua montagem - o chip é menor e mais compacto do que o CCD. E este menor tamanho possibilita a confecção de câmeras também menores.

Chips CMOS apresentam menor signal-to-noise (ruído na imagem) em comparação aos CCDs. Isto porque, ao contrário do que ocorre nos CCDs, onde o sinal de cada pixel é passado para seu vizinho até ser direcionado, na saída do chip, a um amplificador único, no CMOS cada pixel possui, como vimos, seu próprio amplificador independente de sinal de imagem. Esse processo de leitura acarreta menor interferência na imagem.

O chip CMOS já é empregado em algumas câmeras do segmento semi-profissional e existem previsões de que no futuro estes chips suplantarão os CCDs nas câmeras comuns de vídeo. O processo de fabricação do CMOS tende a ser mais barato do que o do CCD, pelo CMOS possuir um circuito eletrônico mais simples e principalmente porque a tecnologia CMOS já é empregada hoje, em larga escala, com algumas diferenças, na fabricação de circuitos integrados de microcomputadores. Assim, um chip CMOS de imagem pode ser fornecido por uma quantidade muito maior de empresas do que um chip do tipo CCD, fabricado hoje por poucas empresas (Sony, Kodak, Matsushita, Fuji e outras), barateando assim seu custo (economia de escala).

Uma das diferenças do CMOS em relação ao CCD em câmeras de vídeo é que enquanto o CCD exige outros chips paralelos fora do mesmo para efetuar as tarefas do processo de captura da imagem (como a redução dos "ruídos" da imagem (noise reduction), o processamento do sinal (DSP - Digital Signal Processor) e a conversão analógico-digital (ADC - Analogical Digital Conversion)), no CMOS todas essas tarefas são executadas dentro do próprio chip. Em outras palavras, enquanto o CCD só faz a conversão da luz em cargas elétricas e as transfere para fora do chip para que todo o processamento da imagem seja feito, o CMOS faz tudo isso dentro do chip. Isso se traduz em menor tamanho ocupado pelo conjunto (menor espaço ocupado dentro da câmera por exemplo) e também permite tornar programável diversas dessas funções (conferindo flexibilidade ao chip, podendo ser programado para várias situações diferentes).

Outra diferença é que o CCD tradicionalmente possui melhor desempenho em condições precárias de luz em comparação ao CMOS, o que, no entanto, também está sendo superado pelo desenvolvimento tecnológico. O aumento no desempenho e qualidade dos sensores de imagem CMOS, tornará seu uso corrente em câmeras de alta definição (HD e HDTV) refletindo-se na diminuição de seu custo final.