Em tempos de cuidados com o meio ambiente, logo o que vem à mente é algo que será dito para protegê-lo das ações danosas da câmera. Na verdade, claro, não existe nada neste sentido, a não ser o descarte inadequado das baterias - o que todo mundo sabe hoje, ou seja, que seu destino deve ser o da reciclagem segura.

Mas o que se pretende aqui é falar justamente o inverso, ou seja, os efeitos do meio ambiente sobre a câmera, mais especificamente - como o tema é o áudio - sobre o microfone. A discussão é válida não somente para o microfone da câmera, mas para, genericamente, qualquer tipo de captação sonora empregando microfones.

Em um ambiente ideal não há "poluição": a idéia por trás disso é que em um ambiente ideal não existem sons indesejados. Sons indesejados são todos aqueles não previstos pelo diretor do filme ou vídeo. Esse controle é muito fácil em um estúdio, desde que se empreguem técnicas adequadas. Mas do lado de fora dele, as técnicas ajudam, mas não evitam a presença desses sons indesejados.

Vamos a um exemplo bem simples, mas que ilustra bem o tema: o som de uma geladeira funcionando. Como cada um de nós muito provavelmente tem um aparelho desses em nossas casas, a não ser que o mesmo esteja emperrado, pedindo consertos urgentes, emitirá um som baixo, característico de todos aparelhos normais desse tipo. Na maior parte do tempo, não nos damos conta do ruído gerado pelo aparelho, apesar dele estar ligado. Assim também não nos damos conta do ruído das ventoinhas do computador (de novo, considerando-se condições normais de funcionamento), nem das saídas de ar condicionado, nem dos aviões que passam distantes, nem do barulho do tráfego do lado de fora da janela, para não dizer que nosso cérebro pode muitas vezes ignorar até o barulho de buzinas e sirenes, se estes forem frequentes em determinado local. Como esses ruídos não nos interessam, nosso cérebro consegue uma forma de "filtrá-los" de nossa percepção.

Porém o mesmo não acontece com os gravadores desses sons, como os equipamentos de vídeo por exemplo. Após a gravação, uma pessoa ao assistí-la, se não estava no ambiente onde se fez o registro do som e, principalmente, se este ambiente tem um ruído de fundo estranho a seu dia a dia, fatalmente perceberá todos esses sons.

O que se coloca então é: são eles desejados na gravação? O que seria perdido em termos de fidelidade de reprodução da atmosfera de um ambiente de bar sem o ruído dos copos chocando-se, o burburinho das pessoas, risadas, música ao longe, etc...? Por outro lado, em uma situação de entrevista por exemplo, pode ser desejado um ambiente sonoro limpo, calmo e tranquilo. É aqui nessa fase que nossos ouvidos nos traem. Acostumados ao ruído do dia a dia, precisamos desligar em nossos cérebros o "filtro" automático dessas frequências sonoras. Uma dica para fazer isso e, no local da gravação, na fase de estudo da locação, fechar os olhos e, em silêncio, prestar atenção em todo som que chega até nossos ouvidos. Você ficará impressionado, depois que acostumar-se com a técnica, com a quantidade de sons que antes você imaginava não existir no local.

O próximo passo é ir em direção a eles e tentar solucionar caso a caso cada um desses ruídos. Determinado aparelho pode ou não pode ser desligado? Talvez um aparelho de ar condicionado possa ser parado por alguns minutos, exatamente durante o registro das imagens e sons pela câmera. Talvez uma janela possa ser fechada, ou então a locação possa ser ligeiramente mudada de local, ainda dentro desse ambiente, para uma posição onde as paredes ajam como filtro desses sons. Ou então a hora do dia onde o registro será feito pode ser mudada, ou até mesmo o dia da semana.

Uma dica sempre repetida é a que diz que quando mais visitas à locação, em horários e dias diferentes, melhor. Isso evita histórias de um trem de carga manobrando em uma ferrovia bem atrás do local escolhido, quando, na visita prévia feita, a linha não estava funcionando. Todos os ruídos existentes e os possíveis ruídos que podem surgir devem ser estudados.

Em situações extremas, não será possível utilizar o som ambiente. Mas, na fase de pós-produção, as imagens podem ser enriquecidas (e muito) com áudio proveniente de um CD de efeitos sonoros, fazendo com que a ilusão seja mais facilmente "comprada" pelo expectador.

Um exemplo é gravar cenas de uma mata e acrescentar na edição sons de pássaros, de água de um riacho, etc... . Isso permite que durante a gravação original todas as atenções sejam voltadas para a imagem, inclusive possibilitando conversas da equipe, barulhos de máquinas próximas e outros. A ilusão vende-se facilmente porque nesses lugares raramente se vêem os pássaros, grilos, cigarras e outros animais que produzem esses sons. Outro elemento facilitador é, no caso do riacho, não ser necessária a sincronização com a imagem. A mesma idéia pode ser aproveitada em outras situações, como simular o barulho de pessoas conversando, o barulho de um restaurante, etc..., em substituição à trilha original, muitas vezes inconveniente.

Quando esses sons não provém diretamente do ambiente, podem ser produzidos por ele de forma indireta, distorcendo um áudio que, de outra forma, deveria ser correto. As ondas sonoras dos sons agudos possuem maior frequência do que as dos sons graves. Ondas de maior frequência são mais facilmente refletidas por superfícies planas, lisas. Em uma sala vazia, quando alguém fala para a câmera de uma certa distância, um microfone colocado na câmera vai captar as ondas sonoras que saem da boca da pessoa e percorrem uma trajetória reta até ele. Mas, também, vai captar as que saem da boca da pessoa, encontram as paredes, o chão ou o teto, refletem-se nesses locais e acabam chegando ao microfone. Estas ondas que chegam atrasadas somam-se às ondas originais e constituem a chamada reverberação. São compostas, como mencionado no início, principalmente por ondas de maior frequência, ou seja, sons na faixa médios para agudos. Pode-se diminuir drasticamente o efeito da reverberação dificultando a reflexão das ondas que não percorrem diretamente o caminho entre a pessoa que fala e o microfone na câmera.

Uma das soluções é colocar o microfone o mais próximo possível da pessoa, situação onde praticamente todas as ondas sonoras captadas pelo mesmo serão diretas e não refletidas. Quando isto não é viável, funciona recobrir a sala (ou buscar outro local) com carpetes, quadros, móveis, etc.., notando que superfícies irregulares absorvem mais facilmente as ondas sonoras - ou seja, é preferível um banco de tecido a um de madeira por exemplo, ou um tapete felpudo a um praticamente liso. É por este motivo que as paredes dos estúdios são recobertas por material especial que dificulta a reflexão das ondas sonoras, com o intuito de eliminar as reverberações.

O microfone de lapela é uma boa alternativa em ambientes com acústica ruim, repletos de ecos / reverberações, em relação por exemplo a um microfone do tipo shotgun, mais susceptível a registrar esses sons indesejados. Além de poder ser colocado próximo da boca das pessoas (ao contrário do shotgun, no exemplo acima), o próprio corpo da pessoa ajuda a bloquear os sons refletidos, pelo menos os vindos da parte de trás da mesma.

Outra situação é quando os sons indesejados não são produzidos pelo ambiente ao redor da câmera, mas vem "de longe": causado pelo vento forte, o atrito do mesmo com a tela protetora do microfone da câmera gera um ruído predominantemente de baixa frequência (grave). Algumas câmeras possuem um dispositivo que, se opcionalmente acionado (wind setting), tenta corrigir o problema. Porém, esta correção retira também boa parte dos graves do som que está sendo registrado. Se isto for problema, ao invés de acionar o dispositivo, tentar mudar a posição da câmera em relação à direção principal do vento ou colocar alguém bloqueando o mesmo pode reduzir bastante o problema. Outra opção é prender um pedaço de espuma sobre o microfone da câmera utilizando fita adesiva. Soluções profissionais incluem o uso de capas próprias de espuma ou fios de algodão, denominadas blimps. Confeccionadas em vários tipos e tamanhos, adaptam-se a praticamente todo tipo de microfone.

O mesmo cuidado aplica-se ao microfone de lapela: assim como microfones shotgun são constantemente protegidos por capas de espuma ou fios de algodão (blimps) para evitar o ruído causado pelo atrito do vento forte com a superfície do microfone, o mesmo deve ser feito com os microfones de lapela. Em determinadas situações, o vento pode soprar de maneira intensa na frente da pessoa, servindo seu corpo como escudo para desviar a corrente de ar. Nesta tarefa, o sensível microfone de lapela acaba captando também da mesma forma o ruído do atrito com o ar. Pequenos moldes de espuma, adaptáveis a esses microfones devem então ser instalados. A diferença no resultado final pode ser significativa, principalmente em situações de vento forte.

Mover-se de um ambiente para outro também pode ser problema: ao terminar uma tomada em um ambiente fechado e levar a câmera para ambiente aberto, continuando a gravação ali, alguns problemas podem surgir com o áudio, principalmente se este lugar externo for desprovido de muros ou outros obstáculos sólidos por perto (como o centro de um campo de futebol por exemplo). Haverá uma diferença notória no som gravado. Apesar de claro e limpo, o som perderá algumas de suas características, passando a ser menos encorpado do que era e tendo menos brilho; será um som apagado, assemelhando-se um pouco ao som emitido por receiver de FM quando abaixamos totalmente os controles grave/agudo. Isto ocorre porque falta, no ambiente aberto, a reverberação, onde o som refletido por paredes, tetos e objetos diversos ajuda a reforçar o som original. Algumas providências podem, no entanto, minimizar essas características do som em ambiente aberto. Uma delas é abrir mão do microfone da câmera (se for o caso) e passar a utilizar um microfone de mão ou de lapela: principalmente para a voz humana, devido à proximidade do microfone da boca, a falta de reverberação não será tão percebida. Outra é acrescentar, na fase de pós-produção, um pouco de reverberação, o que pode ser feito através de um gerador de efeitos de som ou através de uma das opções de controle e ajuste de som do programa de edição-não-linear.

São diversas situações, como as descritas acima, onde pode-se notar o poder de interferência do meio ambiente nas gravações. Interferências muitas vezes ignoradas por nós, com nossos filtros cerebrais automáticos tentando a todo momento fazer o que gostaríamos que os equipamentos fizessem sozinhos: eliminar o indesejado.... talvez algum dia o poder dos processadores permita isso mas, enquanto esse dia não chega, cabe a nós treinar nossos ouvidos e aprender técnicas para apurar cada vez melhor as gravações.