Caminhando pelas trilhas da fita de vídeo
Eduardo Baptista
coluna Fique Ligado, revista Zoom Magazine
Você que está acostumado(a) com os termos alta fidelidade, som estéreo, vídeo de maior ou menor resolução, já imaginou como esses sinais de som e imagem são gravados nas fitas de vídeo? Pois bem, este é o assunto aqui: a gravação dos sinais de som e imagem nas fitas de vídeo dos segmentos consumidor e semi-profissional. E vamos logo começando com o velho e bom (ainda, mas por muito pouco tempo) VHS.
Desenvolvido pela JVC em 1976, foi o segundo formato de vídeo criado para o segmento consumidor, após o Betamax, criado pela Sony. Praticamente todo mundo já teve ou ainda tem um vídeo VHS em sua casa; esse formato foi no passado largamente utilizado para distribuição das cópias feitas a partir dos originais gravados em outros formatos com maior resolução. Por falar nisso, o VHS é um dos formatos com menor resolução, no máximo 250 linhas de resolução horizontal. E aqui, dois lembretes, o primeiro com relação ao termo "no máximo" para a resolução. Para qualquer formato, a resolução máxima é atingida quando temos os melhores equipamentos, as melhores fitas, as melhores lentes, o melhor circuito eletrônico na câmera e as melhores condições de iluminação da cena. Assim, nem sempre um determinado trabalho em determinado formato terá a resolução máxima suportada pelo mesmo. O segundo lembrete: resolução horizontal mede a maior quantidade de traços verticais claros/escuros alternados que o equipamento consegue exibir em determinada linha da tela.
O formato VHS é um formato analógico: ao contrário dos formatos digitais, sofre degradação da imagem e som a cada nova cópia feita. O sinal de vídeo trafega para dentro e para fora do equipamento através de conectores do tipo RCA e tem suas partes de luminosidade (luminância) e cor (cromitância) misturadas. O som trafega separadamente, também através de conectores RCA.
Enfim, as trilhas
Na fita de vídeo VHS a trilha da imagem é gravada de forma descontinuada, ao contrário das trilhas de uma fita cassete comum de som. Isto porque as informações de imagem são muito mais volumosas do que as de som, e a fita precisaria correr a uma velocidade enorme pela cabeça de leitura/gravação se a trilha fosse contínua. O método utilizado para contornar o problema, conhecido como helical scan , faz com que além da fita, também a cabeça de leitura/gravação seja móvel. Aliás, as "cabeças", pois em um cilindro que gira em contato com a fita são montadas 2 ou mais cabeças, ditas rotatórias. O conjunto do movimento da fita e das cabeças faz com que sejam gravados vários pedaços (ou segmentos) de informação um após o outro na fita. E, maravilhas da tecnologia, o equipamento consegue ler / gravar esses pedaços de trilha, montá-los um após o outro e formar a imagem perfeita da Nicole Kidman que você vê da sua poltrona (ok, ou a do Tom Cruise).
No desenho correspondente aos formatos VHS abaixo (VHS, VHS-C, SVHS, SVHS-C), observe a disposição das trilhas de imagem, inclinadas:
E o som? Em VHS existem dois tipos de trilhas de som. Uma trilha segue longitudinalmente a fita: é a trilha de baixa-fidelidade (Lo-Fi), inicialmente mono, que com o passar do tempo passou a ser dividida em duas, tornando-se assim, estéreo. A outra trilha sonora é a de alta-fidelidade (Hi-Fi), gravada juntamente com a imagem. Mas... como isto é possível? Através de um processo chamado depth multiplexing. Imagine uma calha de água de chuva do telhado. Encha-a (não faça a experiência em sua casa) com areia colorida (verde por exemplo) até a metade, e depois complete até a borda com areia vermelha. Pense agora que a calha é a fita de vídeo, ampliada milhares de vezes. E que os grãos de areia são as partículas magnéticas da fita. Agora, o pulo do gato (já que o assunto é telhado....) : a cabeça de áudio passa pela fita e magnetiza com tal intensidade as partículas que consegue atingir a camada verde e a vermelha. A seguir, vem a cabeça de vídeo, com intensidade menor para remagnetizar somente a camada superficial vermelha. Pronto, temos dois sinais gravados, som e imagem, na mesma trilha, mas em profundidades diferentes (daí o "depth"). Na fita propriamente dita, o áudio é gravado a 4 microns da superfície e o vídeo a 0,7 microns (1 micron = 1 mm / 1000) . Essa trilha de som é lida em velocidade bem maior do que a longitudinal devido ao movimento das cabeças, daí o som ter qualidade próxima a do som de CD. E são, na verdade duas trilhas, ou seja, este som também é estéreo.
audio-dub, control track
Existem no entanto outras diferenças entre essas trilhas: como você deve ter percebido, se apagarmos a trilha de som Hi-Fi, a trilha de imagem também é apagada (para desmagnetizar a "areia" verde tem-se que passar pela vermelha). É por isso que não é possível fazer audio-dub nessas trilhas. Em VHS, isso é possível somente nas trilhas de baixa fidelidade, que podem ser substituídas sem afetar a imagem. Durante a gravação, normalmente os dois tipos de trilhas são gravados. Voltando agora ao desenho, existe ainda outra trilha: a Control Track. Para que ela serve?
A cada volta completa do cilindro das cabeças giratórias um pulso é gravado nessa trilha. Na realidade esses pulsos servem para orientar o mecanismo no sincronismo da gravação/leitura daquelas trilhas inclinadas, ou, em outras palavras, é como se alguém ficasse esperando um pulso passar e gritasse "vai!!" para a cabeça. Existe então uma cabeça de leitura e gravação somente para esta trilha, e é essa informação que aciona o contador luminoso do painel do vídeo da sua sala (horas, minutos, segundos).
No desenho aparece "formatos" VHS, porque com o passar dos anos outras variações deste formato foram surgindo, como o formato hi-grade S-VHS (com 400 linhas de resolução máxima) e suas "miniaturas", as fitas compactas VHS-C e S-VHS-C, constituindo-se na "família" VHS. Porém para todos eles a disposição das trilhas na fita é a mesma.
8mm, Hi8
Por falar em família... passamos a outra família, a do 8mm. Criada pela Kodak em 1984 e lançada no mercado pela Sony, devido ao pequeno tamanho de seu cassete propiciou o surgimento de câmeras mais leves e menores do que as VHS e mesmo as VHS-C. E com uma vantagem: a fita menor não trazia como consequência um menor tempo de gravação, como no VHS-C. A resolução horizontal no entanto é a mesma do VHS. O áudio é gravado juntamente com o vídeo, em um processo parecido com o utilizado no VHS, aqui denominado AFM (Audio Frequency Modulation). Apesar de ser um som Hi-Fi, não é estéreo, existe apenas uma única trilha. Com isso, conclui-se também que não é possível fazer audio-dub nessa trilha, sem prejudicar a imagem. Junto com a informação de vídeo também é gravada a informação de controle do mecanismo das cabeças. O desenho 8mm ilustra a disposição das trilhas:
Mas, assim como o VHS ganhou um membro hi-grade em sua família, o mesmo aconteceu com o 8mm: a Sony criaria em 1986 o Hi-8. Em relação a seu irmão menor, algumas implementações: a resolução aumentou, ficando semelhante à do S-VHS: máximo de 400 linhas. E duas novas trilhas apareceram: uma delas, destinada ao som, a PCM (Pulse Code Modulation). Como está localizada na sequência, logo após a trilha de imagem, a cabeça percorre a fita em velocidade maior: é uma trilha Hi-Fi, aliás, duas, porque é estéreo. E a vantagem aqui é permitir audio-dub sem perturbar o sinal de imagem. No entanto, poucas câmeras - geralmente as mais sofisticadas - aproveitam o sinal PCM. E também nem todas as câmeras utilizam a outra trilha própria do formato Hi8: a trilha de Time Code. O desenho Hi8 mostra a disposição de todas estas trilhas:
DV na era digital
Todas estas famílias mencionadas até aqui pertencem ao grupo dos formatos analógicos. No entanto, a grande vedete da atualidade é a câmera digital. Que usa, naturalmente, um formato digital, como o DV. Criado em 1995 por um consórcio formado por dez empresas (Sony, JVC, Panasonic, Philips, Sharp, Toshiba, Sanyo, Mitsubishi, Thompson e Hitachi) este formato especifica dois tamanhos de cassete, Standard e seu irmão caçula, Mini-DV. Este último, devido ao seu reduzido tamanho tem permitido a construção de câmeras cada vez menores - e com a alta qualidade do formato digital: a resolução máxima de 525 linhas é semelhante à do formato profissional Betacam.
Aqui as trilhas dividem-se em quatro setores: áudio e vídeo separadas, Subcode e ITI. O áudio neste formato possui duas opções de utilização: um par de trilhas estéreo de 16 bits de resolução sonora ou então dois pares de trilhas estéreo de 12 bits de resolução cada. Para efeito de comparação, a resolução de 16 bits é considerada semelhante á qualidade do som de um CD (o que também acontece com as trilhas Hi-Fi do VHS e do Hi8). Por outro lado a opção de se gravar dois pares ao invés de um permite a opção de audio-dub. A trilha Subcode armazena dados do Timecode, a data, hora e a numeração da trilha. A ITI (Insert and Tracking Information) armazena informações para orientar o mecanismo de gravação a efetuar corretamente a inserção de imagens sobre conteúdo já gravado (vídeo insert). O desenho DV mostra a disposição das trilhas:
Mais recentemente, em 1999, a Sony criaria o formato Digital-8. Porém, ele também é um formato DV, com a diferença de gravar nas mesmas fitas utilizadas no formato Hi8. A vantagem é o menor custo destas fitas em relação às Mini-DV e o fato de que as câmeras Digital-8 são poliglotas: também lêem fitas gravadas em Hi8. E com uma vantagem: convertem automaticamente seu sinal em sinal DV, que pode ser enviado a um micro para edição. Há no entanto uma restrição com relação às trilhas de som: as câmeras Digital8 não gravam trilhas de 16 bits, somente a versão de 2 pares de 12 bits.